30/06/07

Crónicas de José Cardoso (3)

Recuando no tempo em relação às anteriores crónicas, reporto-me a 1946, ano do meu desembarque no cais do Pungué, levado pelo navio costeiro, “Luabo”, tinha então 16 anos. Encontrei ainda a velha Central Eléctrica a resfolegar de esforço e de velhice, que viria a ser substituída em 1948, pela nova “Central Termoeléctrica” da Munhava. No primitivo terreno seria então erguido o prédio Megaza, como o foram logo a seguir, nos terrenos adjacentes, os prédios da Casa Bulha, A. Teixeira, Entreposto Comercial, Hotel Embaixador e outros, em zonas que eram antes pantanosas e inundadas pelas marés vivas que subiam o Chiveve, formando lânguas de difícil acesso.
Antes destas modernas construções iniciadas a partir dos primeiro anos de 1950, que marcavam o início de um desenvolvimento urbano assinalável, lembro-me, que na área a que me reporto acima, sobressaía, entre velhas construções térreas geminadas destinadas ao pequeno comércio chinês e hindustânico, o interessante edifício de três pisos que dominava a zona e que era a sede do “Clube Chinês”. Teria já na época a que me reporto, segundo informações que obtive, cerca de duas dezenas de anos.
Na área ocupada actualmente pela frequentada Praça do Município, que foi projectada e construída no meu tempo, passando a constituir a sala de visitas da cidade e o seu postal turístico mais representativo, depois das praias que se alongavam desde a praia dos Pinheiros, passando pela dos Alemães e até para além da mais apreciada pelos turistas, a do farol do Macúti, situavam-se as instalações comerciais da Casa Bulha, do F. L. Simões e o Bar de um cidadão grego cujo nome, se não me falha a memória era o de Kusdakis ou qualquer coisa semelhante em termos homófonos.
Estes estabelecimentos, todos eles em madeira e zinco, ladeavam uma via que era o prolongamento da rua General Machado e onde, no sentido do porto, se situavam e ainda se situam à direita, os “Correios”, o “Rádio Scala” a “Cooperativa da Beira” e a “Farmácia Graça” e do lado oposto, num longo edifício, o “Ramchand” e o “City Stores”, ocupando o primeiro andar a “Pensão Theodorakis”. Mais adiante o “Dayram”, que ficava isolado entre dois terrenos devolutos, seguindo-se-lhe um alongado edifício de dois pisos, onde se situavam as “Obras Públicas” e os “Serviços de Viação” que ladeavam, em parceria com a “Casa Portugal”, o “Standard Bank” o “Barclays Bank”, e que me lembre a “Pensão ou Hotel Beira”, o largo Luís Inácio, mais tarde a praça do “Lacerda” como era conhecida.
Aquela que era a avenida da República, única em betão armado no Império Português, ia do local onde foi implantada a Praça do Município até à Praça da Índia. Era das mais antigas da cidade e a partir de certo ponto, a mais apreciada, pelas duas extensas orlas de velhas acácias e jacarandás que a ladeavam e ainda ladeiam desafiando os tempos, e cujos ramos se abraçam no alto, formando um túnel aprazível de refrescante sombra. Continua hoje, no essencial, a ser igual à que conheci na época: a mesma estreiteza de pisos para automóveis e peões, a mesma decrepitude. Mais degradada está a situação do solo pavimentado e utilizado por peões e veículos, apresentando pronunciadas lombas e fissuras, provocadas pela pressão das raízes subterrâneas em resultado do seu inevitável desenvolvimento e expansão ao longo de dezenas de anos.
Os edifícios de maior relevo que lhe davam alguma importância, eram o do “Avenida Hotel” seguindo-se a meio do percurso e em direcção à “Ponta-Gêa” o hospital europeu “Rainha Dona Amélia”, assim conhecido porque servia apenas a europeus, seguindo-se a “Sé Catedral” com a “Escola de Artes e Ofícios” da diocese, tendo em frente a “Escola Eduardo Vilaça” e o edifício que fora antes o “Grémio dos Empregados da Companhia de Moçambique” e mais tarde o “Clube da Beira”, e um outro, onde funcionou a “Emissora do Aero Clube da Beira”, e hoje se situa a “Farmácia Beira”, aberta por Tzitzivacos, um farmacêutico de origem grega, e mais adiante, junto à praça onde pontuaria mais tarde o “Cinema São Jorge”, situava-se e ainda se situa o “Colégio Nossa Senhora dos Anjos”, o colégio das “Mères”, como era então conhecido.
O “Avenida Hotel”, o “Hotel Savoy”, encostado à muralha e junto ao “Clube Inglês”, e o “Beira Terrace” implantado num amplo jardim, também sobranceiro à muralha de protecção à cidade e com vista para a baía, eram cartaz da hotelaria beirense na época. De destacar eram ainda os edifícios do “Tribunal”, dos “Correios”, das “Repartições do Governo” que fora antes da “Companhia de Moçambique”, a “Casa Portugal”, o “Standard e o Barclays Bank”, o “Cinema Olympia” e a “Cadeia”, todos eles na Baixa.
Com excepção do “Beira Terrace” que foi consumido pelo fogo ainda no meu tempo, todos os demais ainda existem e de tão antigos, deviam merecer o estatuto de património da cidade, porque são a sua memória e constituem páginas importantes da sua história.
in “Memorandos da Vida” II Volume, de José Cardoso

1 comentário:

Anónimo disse...

olá
Gostava de ver a Farmácia beira,não sei que ficou lá,será que foi a firma mendes?.obrigada pelas fotos que vi,gostei muito


OLÁ
GOSTAVA DE VER A FARMÁCIA BEIRA,E AFINAL FICOU COMQUEM? TAVEZ A FIRMA MENDES SERÁ?
ABRAÇOS
BRA.